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quarta-feira, 9 de setembro de 2009

MARCELINO FREIRE

*****Como o blog está aberto a sugestões e indicações, temos aqui uma das pérólas de uma amiga-bloqueira, Márcia: Marcelino Freire, um escritor pernambucano que recebeu, em 2006, o Prêmio Jabuti por "Contos negreiros" (Record).Ele tem seus textos publicados nos jornais de mais renome não só no país, como também em Portugal e no México.


*****Pesquisando sobre ele... achei um site com uns projetos gráficos muito bacana [http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_visual/marcelino_freire.html]

“Marcelino colhe ditados populares, lugares-comuns e extrai deles, ou melhor, destaca letras dos textos para completar, contradizer, ironizar, irreverentemente, com humor e malícia, o sentido original...” Abaixo, dêem uma olhada no projeto gráfico de Silvana Zandomeni evidencia a forma, induzindo a releitura. Extraídos do livro “ era O dito” do próprio Marcelino...

*****Vejamos:

Acompanhante
Marcelino Freire

Sujar ele se suja. Mas não se preocupe. Há um cinturão de fraldas. Um nó gordo que segura. Para não escorrer na poltrona. Melecar a parede da sala. Um dia até no teto ele deixou uma manchinha pendurada. Feito uma criança que voa. Cuidado para ele não comer bosta à toa. Coitado! O que é a idade? Ave! Você precisava ver como ele era. Eis a fotografia. Quem diria? Era? Ou? Não? Era? Outra? Pessoa? Minha? Filha?
Sopa de ervilhas ele adora. É preciso saber cozinhar. Tudo o que ele for engolir aconselho triturar. Mole. Mole. Coisa dura nem pensar. Nada de dentadura. Digo assim. Na hora de almoçar. Papar. Periga ele se engasgar como numa certa vez. Os dentes foram sugados. E a outra menina teve de puxar. Lá de dentro. Ele já quase morrendo. Roxo. Eis aqui. O copo é este. Desde muito tempo. Ele só bebe neste copinho. Que bonitinho! Da! Cor! Que! Ele! Gosta! Minha. Filha. Cinzento!
O banheiro é este. A banheira é esta. Você vai ter de acompanhar. Pode lavar a cara e as costas. Esfregar. Esfregar. Esfregar. Nem pense em economizar. Vá fundo. Só não deixe o esqueleto pular muito. O sabonete naufragar. Cair. O xampu entrar nos olhos. Porque ele começa a gritar. A espernear. A mijar feito um afogado. Quem ouve pensa. Estão matando o que já está morto. Salvem o coitado! Aquele alvoroço. Como se a gente tivesse coragem de esganá-lo. Que pecado! Minha. Filha. O? Que? Passa? Pelo? Coração? Deste? Povo?
Ah! Para dormir não dá trabalho. É só contar uma história. Ajudar o diabo a rezar. Se quiser pode até cantar uma cantiga de ninar. Antiga. Que ele aprova. Vou ser sincera. O problema é quando ele acorda. Por causa de um pesadelo. Uma saudade. Algum desejo que ficou. Sei lá. Adormecido. Ele perde o juízo. Baba. Espuma. Vai querer você bem perto. Pertinho. Ele tira a roupa. Feito um debilóide. O pobrezinho. Mas veja. Não é nada muito sério. Ele só se sente sozinho. Deite-se com ele. Minha. Filha. Não há perigo. O. Velho. Só. Precisa. De. Um. Pouco. De. Carinho



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